Opening

"[...] cá entre nós, isto é uma parábola: um bom astrônomo saberá ler nas estrelas sinais e símiles que nos permitem silenciar muitas coisas." (F.W. Nietzsche)

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

O CINTURÃO Ψ

O CINTURÃO PSI
(OU: Homologias fractais e o Umbral de Consciência)



"Dorme, guarda, até que as Esferas 
Tenham rodopiado mil eras
E que eu arda ao retornar 
Onde hoje é meu lugar
Novos Astros chegarão 
E no céu se instalarão:
Astros que louvam, acalantam, 
E o suave olvido implantam.
Somente quando eu terminar o meu giro
O Passado virá a inquietar o teu retiro"
 - H.P. Lovecraft, "Polaris".

                Do Sol até Marte, temos estudado as forças astrológicas como uma manifestação, em um nível fractal galáctico, de certas forças essenciais (arquetípicas) que se manifestam da mesma forma no nível fractal da mente humana: o estudo dessas homologias fractais, a forma de pensar de todas as ciências milenares, é a própria prática da Astrologia.
                E como tudo o que é arquetípico e manifestado na Matéria se repete em diferentes níveis fractais do universo, é fácil encontrar certas relações que a ciência moderna entende muito mal; por exemplo, um mesmo arquétipo, ao ser manifestado, se quebra em um par de princípios opostos, então uma única manifestação gera “espelhos” de si, como os pares de signos: por exemplo, o eixo Gêmeos-Sagitário diz respeito ao intelecto, manifestado desde o ponto de vista informacional e amoral de gêmeos até o caráter sacralizante e ideológico de Sagitário: um degradée de tons de um mesmo processo. 

                Seguindo o esquema estrutural da Psique proposto por Jung, Moyano e outros, as forças organizadas até aqui agem diretamente na base da construção do pensamento, ou seja, são forças condicionantes do pensamento. Uma vez que o pensamento adquira suficiente força de ligação com o Sol (self anímico) ele ascende pelo umbral de consciência Psi (Ψ), onde está à mercê de outras forças, similares às anteriores, porém pertencentes à esfera de Luz da Psique, à plena consciência. É como uma nota musical que se repete em oitavas superiores (dó menor, dó sustenido, dó maior e assim por diante). Essa analogia é tão exata que vou usar a expressão ‘oitavas superiores’ para designar a repetição de uma mesma força astrológica na Esfera de Luz!

                Mesmo se pensarmos em termos da Astrofísica, os corpos celestes de Mercúrio até Marte são substância mineral, cujas células de convecção térmica se organizaram de forma a condensar o material pesado no núcleo e trazer os leves à superfície, onde resfriaram e formaram rochas. Pode-se andar sobre eles, em teoria.

                Já a partir de Júpiter, os planetas se formaram por acreção (junção e condensação) de poeira e gases cósmicos, sendo efetivamente grandes bolas de gás condensado, com grandes tempestades e temperaturas letalmente baixas. É possível pensar neles como pertencentes a uma ordem mais etérea e imaterial, e sua distância e lentidão de sua precessão fazem com que sejam chamados com freqüência de “astros geracionais”, pois especialmente os planetas trans-saturninos podem ficar numa única casa zodiacal por uma geração inteira de humanos.

                O que vou apresentar em seguida é uma adaptação de uma teoria desenvolvida pela Sociedade Astrológica da Grã-Bretanha sobre a antiga “Lei” de Bode e suas conseqüências para a organização conceitual das esferas planetárias.

A LEI DE BODE

                Formulada originalmente por Johann Titius em 1772, e popularizada por Bode, foi tomada na época como uma lei científica até a descoberta de Netuno, que escapou da regra, derrubando a lei.
                Comecemos construindo uma série A = {a1, a2, a3,...,an} onde a1 = 0, a2 = 3, e os termos seguintes são o dobro do anterior:

0, 3, 6, 12, 24, 48, 96, ...

                A Série de Bode pode ser expressa por  B = {b1, b2, b3,...,bn} tal que Bn = (an + 4)/10, ou seja, soma-se quatro aos termos da série A e divide-se o resultado por 10:

0.4, 0.7, 1, 1.6, 2.8, 5.2, 10, ...

                A distância linear entre o Sol e a Terra é de 93.000.000 milhas, distância que se tornou medida-padrão na mecânica celeste como a Unidade Astronômica (UA). Se compararmos a distância dos planetas ao Sol, em termos de UAs, com a série de Bode, temos:

Planeta
Distância em UA
Série de Bode
Mercúrio
0,39
0,4
Vênus
0,72
0,7
Terra
1
1
Marte
1,52
1,6
?????
----
2,8
Júpiter
5,2
5,2
Saturno
9,54
10

                Quando Bode chamou a atenção dos astrônomos para esse fato, na época, pensavam estar diante de uma lei mecânica! E foi considerada assim por certo tempo, mesmo com o vácuo na série entre Marte e Júpiter: o próximo termo da série seria 19.6, e quando Herschel descobriu Urano a 19.18 UA, a lei de Bode realmente parecia certa!

O primeiro asteróide foi descoberto a 2.8 UA pouco depois, preenchendo a lacuna. Muitos outros asteróides foram descobertos perto deste, e especula-se que tenha sido antes um planeta, destruído e reduzido a asteróides.

                A posição do próximo planeta foi procurada a 38.8 UA, mas quando encontraram Netuno, a 30 UA, a posição científica empirista e rígida declarou que a lei de Bode era mera coincidência e não podia ser usada. Plutão, no entanto, foi encontrado em 1930 a 39.44 UA, preenchendo a posição que caberia a Netuno.

                O próximo número da série é 77.2; em 2004, foi descoberto o planetóide Sedna, que tem uma órbita extremamente elíptica e uma precessão de 5 mil anos em volta do Sol; no solstício de verão, o ponto mais próximo do Sol, Sedna está a 76 UA, de acordo com a Lei de Bode, mas no inverno está a 900 UA do Sol, efeito de sua órbita irregular. Sedna, e o teórico cinturão de Oort, serão objeto do meu último artigo dessa série, aguardem!



ALÉM DA LEI DE BODE: 
PARES ESPECULARES E HOMOLOGIA ESTRUTURAL FRACTAL

                Até agora foi apresentada a Lei de Bode, que pode ter um fundo harmônico ou ser apenas uma coincidência numérica, mas o mais interessante, e útil, está por vir.

                Vamos considerar o período de cada planeta, que é o tempo que leva para dar uma volta em torno do sol. A Lei de Kepler estima que o quadrado do período, T, é proporcional ao cubo da distância R:

é proporcional a

 Planeta
Período real
Período de Bode
Mercúrio
0,24
0,25
Vênus
0,61
0,6
Terra
1
1
Marte
1,88
2
Cinturão Ψ
4,66
4,68
Júpiter
11,68
12
Saturno
31,6
29,5
Urano
84
86,8
Netuno
164,8
----
Plutão
247,7
247,7

Estes números encerram em si uma série de “coincidências” que o Astrólogo experiente saberá usar a seu favor. Netuno está à parte no esquema, o que se justificará pela própria natureza da Esfera de Netuno: uma força onírica, de ideais e escapismos, de negação da realidade concreta, material. Parece que o próprio Astro, regente de Peixes, se recusa a participar da ordem geral e orbita, sonhador e distraído, no ritmo de seu próprio alento. Voltando aos números, de especial interesse aqui é a relação que se segue:

                Chamemos o cinturão de asteróides de Ψ, e organizemos os planetas em torno dele em pares, de dentro pra fora:

Marte/Júpiter
[Terra/Lua]/Saturno
Urano/Vênus
Mercúrio/Netuno

                Para cada “par”, vamos calcular a razão de seus períodos, medidos em anos terrestres:
Razão
Marte/Júpiter
6,3
Terra/Saturno
29,45
=
6,3
x
4,67
Vênus/Urano
137
=
29,45
x
4,65
Mercúrio/Netuno
684
=
137
x
4,99

Esse fator multiplicador, em torno de 4,66, é o valor que resulta para uma órbita de Kepler calculada a 2.8 UA, ou seja, o período teórico do ex-planeta destruído que chamaremos de Cinturão Psi.

                Se considerássemos o par Lua-Plutão, teríamos

Plutão-Lua
3319
=
684
x
4,85
               
Porém, Plutão terá outra importância no sistema, pois passaremos do sistema solar moderno, objeto de estudo da Sociedade Astrológica britânica, para o sistema aristotélico, um modelo mais coerente e uma conclusão mais incisiva podem ser alcançados.

Até aqui, o modelo de um sistema solar que tem no Cinturão Psi um eixo de simetria nos permite organizar o sistema como um fractal, fato corroborado pela diferente natureza física dos dois tipos de planetas, com cosmogêneses diferentes e uma analogia mitológica importante: diz-se que, quando a consciência humana evoluiu por conta do aprisionamento espiritual, o TERCEIRO OLHO que captava os Arquétipos se fechou definitivamente: assim, o antigo planeta eixo de simetria foi pulverizado e transformado numa miríade de asteróides (como o Vultus Spiritus foi disperso no pólo infinito). 

Porém, o modelo dos ingleses tem duas deficiências: Não consideramos a Terra como uma força astrológica per se; o Sol não foi contemplado no esquema.

                Se tomarmos o sistema solar inteiro como um modelo homólogo da Psique, o Cinturão Psi corresponderia ao Umbral de Consciência Psi através dos quais os pensamentos emergem, e no nível galáctico o Sistema Solar passa de um nível grosseiro de matéria para outro mais sutil.



                Como na escala musical, entramos em outra oitava, e as mesmas forças primordiais se manifestam em outro nível fractal de consciência, ou seja, existe uma homologia fractal que faz com que os seguintes pares de forças sejam espelhos um do outro em níveis diferentes:

                 Nível Infra-Ψ
Nível Extra-Ψ
Sol
Plutão
Lua
Netuno
Mercúrio
Urano
Vênus
Saturno
Marte
Júpiter

                 Assim, Netuno é uma oitava superior da Lua, ou seja, é a mesma força agindo no âmbito da Esfera de Luz da consciência, e assim por diante, com todos os cinco pares acima. Apenas para ninguém estranhar o fato de a Lua estar mais próxima do Sol do que Mercúrio, lembremos que estamos trabalhando com o conceito aristotélico de Esferas planetárias, diferente da ordem física: o Sol e a Lua são as forças mais próximas da Terra (o self e a esfera de pré-consciência são comuns à maioria dos seres vivos), e daí sim as forças se expandem na direção de sua distância solar (os seres conforme evoluem vão ganhando variáveis mais sofisticadas na psique)...


                Essa reorganização faz o Sol parear com Plutão, o que torna o planeta de Hades como o Sol de uma consciência superior, talvez o próprio Sol Negro dos antigos Árias, pois enquanto o Sol aglutina em si as experiências vividas pela Psique e forma um Ego consciente, Plutão propicia a experiência da Morte, o desvincular dos entes não-essenciais que força a consciência humana a reorganizar seu senso de “eu” em torno de si mesma, e não de entes externos cuja relação egóico-afetiva pode ser cortada. O Sol solidifica as experiências, e Plutão opera para cortar o supérfluo e lapidar o Ego até a individuação pura, sendo cabível uma concepção de um Sol Transcendente ou um Sol Negro.

Neste capítulo dos Simpsons, um exemplo visual de como um mesmo ente, Homer Simpson, tem duas manifestações distintas em dois planos de significação - os mundos 2d e 3d - sendo essencialmente o mesmo e ao mesmo tempo diferente:



                 Apenas como curiosidade, após Plutão existe um outro cinturão, o de Oort, cujos planetas foram formados por forças mais antigas que o Sol que não existem mais nessa galáxia. Vesta e Sedna estão lá, possivelmente como oitavas superiores de Júpiter e Saturno, exercendo homologia funcional com forças psíquicas além das humanas, afetando formas superiores de consciência ou talvez as próprias almas desencarnadas no plano astral! De qualquer forma, dificilmente dizem respeito à maioria da humanidade, assim como um platelminto não seria afetado por forças de uma consciência sofisticada como Júpiter ou Urano.

                De todas as formas, eu não poderia prosseguir de Marte a Júpiter sem transpor o Umbral de Consciência, que separa as forças semiconscientes, pré-humanas, das forças conscientes propriamente humanas! Se até o momento todas as forças foram de aglutinação e organização de experiências, pois orbitam em torno do Sol Vermelho que é o Self aglutinador de experiências, os planetas Extra-Psi serão forças de rompimento e de refinamento, forças que lapidam tudo o que foi acumulado pelas forças psíquicas Infra-Psi: fazem desta forma, pois sua influência é do Sol Negro, Plutão, que traz a Morte ao superficial e deixa apenas o essencial a ser descoberto.

                Sob este ponto de vista, seguirão os próximos artigos! Conforme deixamos explícitas nossas forças internas mais primordiais, começamos a lidar com influências mais elaboradas, sutis, menos óbvias e cada vez mais insidiosas, até o limite mais fino e tênue do que somos capazes de compreender... mas nada nos garante, e inclusive existem todas as evidências ao contrário, de que somos sutilmente levados por forças de tão lento acúmulo e tal grau de sutileza que mal conseguiremos distingui-las: por ora, basta termos a consciência que o 'nosce te ipsum' é um exercício interminável, pois as mesmas forças arquetípicas se espelham, ad infinitum, em distintos planos de significação e contexto que vão do puramente animal ao puramente Espírito - e todas as nuances intermediárias!

As above, so below...


Ennoia, Isaria,
Aus der Lichte der Mond
Aus der Dunkel der Nacht
Nahst du dich in deiner Macht



quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Marte Astrológico

Marte Astrológico


 - “Podem prender minhas pernas, mas nem o próprio Zeus pode tirar de mim meu livre arbítrio” - Epíteto

Brilhando em noites claras como um diamante de sangue nos céus está Marte, o primeiro astro a estar mais longe do Sol do que a própria Terra – um aviso aos viajantes: a partir deste ponto, deixamos o mundo claro da superfície em definitivo (a Lua ainda possuía características “emersas”, como um veículo que levava da esfera de sombra à esfera de luz) e começamos a adentrar o mundo subterrâneo da psique, com forças cada vez mais inconscientes e aterradoras. É o último planeta sólido – daqui por diante entramos na matéria sutil e em reinos mais etéreos...

            Na Roma primitiva, Marte era chamado Mavors, de origem proto-indo-ariana M̥rēs, lutar ou batalhar: na Grécia, o termo se tornou marnamai, com o mesmo significado, e no dialeto Punjabi da índia, maarna significa atingir, matar: mesmo no inglês moderno, temos a palavra maim com significado igual.

            A etimologia dá uma pista sobre a força violenta, ativa e irruptora representada pela esfera de Marte; ela é necessária como instinto de sobrevivência e sexual, mas no cerne da questão da importância dessa esfera astral está a questão do agir: até agora, no caminho do Sol – Lua – Mercúrio - Vênus, temos a assimilação dos conteúdos pela mente, a emergência do conteúdo da esfera de sombra, sua racionalização e classificação conforme o grau de ligação do ente percebido pelo Ego, respectivamente.


            A julgar por estas quatro forças, o ser humano seria um grande acumulador passivo de conteúdos mentais. Entretanto, a existência não contempla apenas a assimilação, mas a inter-ação e transformação da realidade circundante, e Marte fornece esse ímpeto conquistador  e transformador. Sendo um Deus marcial, não se deve entender que Marte rege apenas a guerra como embate de forças armadas, mas seu sentido é mais amplo: Ares/Marte incorpora o esforço de guerra humano pela intervenção e transformação de sua realidade, todas as situações em que é próprio ser duro, combativo, violento: em uma palavra, uma força de renovação.

            Tanto que a etimologia de Ares é o termo dórico ara, significando imprecação, ruína, maldição, banimento. Todas forças saudáveis e necessárias da vida – quando o criador hindu, Prajapati, começou a se angustiar com o acúmulo de criações cinzentas e esgotadas, Shiva lhe propôs ter a piedade de deixar que as criações morressem e se renovassem, e assim ele vibrou e materializou a bela dama de escarlate, Mrtyu, a Morte, que peregrina pelo mundo ceifando aquilo que já carece de potência interior, dando paz a tudo o que é combalido e esgotado.

            E se todo o marcial pode ser sintetizado na idéia de transformação e renovação, essa idéia arquetípica manifesta-se em dois pares de opostos complementares, que explicam o fato de Marte reger os signos de Áries, o signo do Jasão que ousou e arriscou tudo pelo velocino de ouro, a força pura da ação, e Escorpião, o pequeno porém venenoso assassino de Órion enviado por Gaia como uma evocação da própria essência do intenso e do letal.

            Do lado criativo, Marte se manifesta sempre que necessitamos de coragem para uma empreitada, na forma do ímpeto da ação, da ira e da impulsividade tão necessária aos instintos de sobrevivência. Marte é quem faz nossos olhos brilharem e as mãos avançarem atrevidas para tomar ou repelir aquilo que se deseja possuir ou destruir. É a essência da mão-na-massa.

            Aqui é interessante fazer notar que, ao contrário do Marte romano, um deus militar sério e digno, o Ares grego era tido como um bruto, perigoso e não muito inteligente: eles o evocavam com sua carruagem alada puxada por Phobos e Deimos, o Medo e o Terror, mas temendo os efeitos arrasadores de sua presença, que inspirava um impulso violento impossível de saciar. Além disso, o famoso amante de Aphrodite (a Ação sempre é guiada pela inspiração da Beleza) foi diversas vezes posto em situações vergonhosas ao persegui-la e certa vez caiu numa armadilha de Hephaistus e foi exposto ao ridículo perante todo o Olimpo: para entender esse arquétipo, basta pensar nos indivíduos que arruínam e são arruinados por se renderem ao impulso de saciar um desejo – estupradores, assassinos, cleptomaníacos e compulsivos obsessivos em geral. O temor grego de Ares vem da necessidade de, mantendo o desejo, frear o impulso e agir com estratégia e inteligência.

            Do lado escorpiano de morte/regeneração, Marte corporifica a coragem de destruir e reconstruir, quebrando os grilhões do apego e a tensão dramática posta sobre um fato, um ente, uma idéia: em Esparta, as crianças que iniciariam os treinamentos de guerra cumpriam um ritual noturno no qual sacrificavam um filhote de cachorro a Enyalios, a versão espartana mais ctônica, obscura e subterrânea de Ares, provando sua coragem para o desapego e a dureza, qualidades que toda sua vida futura exigiria. Também Marte representa a coragem de se sacrificar, ou de sacrificar algo de si, para a realização de algo importante, como os Kamikazes japoneses que, efetivamente, se tornaram Deuses do vento por seu sacrifício (como seus comandantes prometeram), ou o famoso mensageiro que levou a Atenas a notícia da vitória grega em Maratona e morreu da exaustão subseqüente.

            No entendimento popular, Vênus é associado às mulheres – sem dúvida a grande inspiração de beleza na civilização humana e as protetoras psíquicas e telúricas do cerco familiar (alegoricamente, as mulheres nórdicas andavam com molhos de chaves na cintura, pois elas controlavam as portas do lar e da aldeia), assim como Marte é associado ao masculino, pois é uma premissa que cabe ao homem, arquetipicamente dizendo, a interação transformadora com o meio e o eterno jogo de queda de braço com a natureza e a vida: cabe aos homens a iniciativa, a coragem, e todas as ações das quais se haure forças da Esfera de Marte, e também o saber direcionar os impulsos e reações para uma melhor canalização de forças, pois se cedêssemos sem resistência às pulsões subconscientes da Lua seríamos pouco mais que animais cultos.

            Nisto cabe uma chave importante para um bom aproveitamento da Esfera de Marte: seu poder de ação, domínio, morte e transformação vale tanto para o mundo externo quanto para o próprio mundo psíquico: vem de Marte a força que rompe vícios, revoluciona pensamentos e comportamentos, e nos “chacoalha” quando aprendemos uma lição dura que exige mudança imediata de direção. Podemos pensar nesta Esfera como uma força plástica da psique, que molda a mesma de acordo com alguma vontade consciente. Por vezes se confunde, por ter natureza similar, àquela fonte de energia espiritual infinita que brota da ira e que os místicos germanos chamaram Vril.    

           
Em resumo, a esfera de Marte possui uma qualidade vital para a vida humana, segundo a qual não aceitamos a realidade das idéias e fatos de forma passiva, mas podemos destruir, mover, alterar, desmontar e remontar suas partes de acordo com nossas aspirações ou necessidades. É o instinto de sobrevivência, o instinto sexual, a coragem, a orientação para a ação, o ímpeto, a Vontade expressa de não ceder tiranicamente aos impulsos do subconsciente, de exercer auto-controle.

            E, como expressão de Vontade, Marte possui uma chave crucial para a superação do meramente-humano e a via da Übermenschheit. Se temos o poder de não apenas seguir a corrente do que Nimrod de Rosario chama de Caminho Elix (a evolução temporal inexorável de acordo com um plano arquetípico), mas podemos a cada instante fazer escolhas de caminhos a seguir, que por esse tão louvado livre-arbítrio sejam dadas graças a Marte, a pura força volitiva que é a única capaz de nos fazer cada vez mais livres!

           
             
SÊ UNO COM O ETERNO
DOMINA TEU UNIVERSO INTERIOR E DOMINARÁS O UNIVERSO
O ESPÍRITO CRIATIVO SEMPRE VENCE
A FORÇA DE TEU ESPÍRITO TE FARÁ LIVRE







Ennoia, Isaria,
Aus der Lichte der Mond
Aus der Dunkel der Nacht
Nahst du dich in deiner Macht

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Lua Astrológica

A Lua Astrológica



“A mente humana é como a lisura de um lago calmo: por baixo da placidez silente de sua superfície espreitam aqueles inomináveis seres cujas garras capturam o incauto navegante e o arrastam para baixo, para o abismo gélido aonde Dagon, o deus cruel, nada e reverencia Aquele cujo nome não pode ser pronunciado.”
                - Da obra de ficção “Alone in the Dark”


                Quando eu estava no início dos meus estudos de astrologia, me apoiava fortemente num manual de duas autoras americanas para a interpretação dos planetas nos signos, e eu lembro que delinear a Lua nos mapas era um aborrecimento... descrições tão longas e variadas, quase incoerentes em alguns pontos! Não seria possível condensar e resumir melhor (ou seja, em menos de uma página inteira) o que seria, por exemplo, uma Lua em Áries, ou uma conjunção Lua-Netuno?

                A experiência e a incorporação de outras interpretações não apenas astrológicas, mas alquímicas e gnósticas em geral, ensinou que a Lua está longe de ser lógica - quanto mais facilmente definível! Enquanto Venus incorpora o lado manifesto do Feminino, sua ação no mundo, a Lua representa todos os Mysteria, o lado oculto por excelência de nossa esfera emotiva. Vamos nos aproximar aos poucos da questão.

                Na psique humana, o medo da Noite, a riqueza de expressões e metáforas – em todos os idiomas – que ligam a noite ao soturno, oculto, sombrio e clandestino, assim como o período ser associado em geral a seres fantásticos e medonhos, e animais agressivos e violentos, revelam algo do papel da Lua como contraparte fundamental do Sol: em contraste com a clareza e previsibilidade de tudo o que é claro, ao contrário da personalidade consciente e da imagem bem definida que temos de cada um de nós, a Lua representa a escuridão do inconsciente, o lado indefinível e que ainda-não-veio-à-tona da nossa psique.

                Podemos por exemplo ser educados e esclarecidos sobre um preconceito qualquer, que em contato com a coisa ainda temos aquele arrepio e repulsa “como que brotando de dentro”, a despeito de sabermos racionalmente que a coisa é inofensiva. Temos claros conflitos entre o que sabemos ser correto pensar/sentir e o que realmente pensamos/sentimos, o instinto que insiste em não ser domado. O impulso de agir que brota de dentro e que ocasionalmente nos surpreende com um lado de nós mesmos que “não conhecíamos”.

                Falando mais claramente, a Lua representa a Esfera de Sombra da psique, que reúne as reações inatas e os pensamentos subconscientes, que povoam nossa mente, mas que não foram racionalizados.

                Muitas pessoas se sentem desconfortáveis ou insaciadas com a descrição do signo solar. Especialmente quando falo da Astrologia Sideral, que faz a maioria das pessoas regredir um signo no mapa [escreverei sobre o assunto em breve], há uma insatisfação imensa, pois embora geralmente se concorde, racionalmente, com a descrição do signo solar, resta uma sensação de que “não sou só isso”. O que é óbvio. Como astrólogo, vejo como uma irresponsabilidade falar do signo solar isoladamente, quando a descrição mínima seria do sistema Sol-Lua, a junção das esferas de luz e sombra completando o contorno do esquema do ser. Um virginiano com Lua em Áries vai ser mais agressivo e crítico do que outro com a Lua em Câncer, por exemplo. A junção Sol-Lua, o Casamento Alquímico, fornece um primeiro e superficial esboço da psique, sua “silhueta”, por assim dizer.

                Neste sentido, um estudo dos aspectos entre o Sol e a Lua fornece informações adicionais valiosas sobre a mente da pessoa. Uma pessoa muito querida possui Sol em Peixes e Lua em Virgem: quase uma oposição, ou seja, uma tensão entre forças opostas, quando a mente racionaliza e cristaliza como ego consciente o oposto do que o subconsciente sugere em sussurros esparsos e reações mecânicas em momentos de crise. Esta pessoa tem o instinto pisciano tipicamente sonhador e altruísta, e cobra isso de si mesma em um nível de detalhe e perfeição digno do signo de Virgem. Outra conhecida possui também o Sol em Peixes, mas a Lua exaltada em Touro, resultando numa personalidade mais pé-no-chão e realista, preocupada com o prático e pragmático, equilibrando a força do signo solar.

                Um aspecto positivo ou negativo entre o Sol e a Lua poderiam determinar a natureza do Casamento Alquímico, sinalizando uma série de armadilhas mentais e potencialidades, sendo portanto uma ferramenta poderosa de psicanálise e um ponto de partida para um real e profundo ‘nosce te ipsum’.

                Nos mistérios iniciáticos, a Lua figura como protagonista, pois é a chave para a liberação de forças inconscientes que dão ao Ego mais profundidade e potência – é a chave da intuição, e o princípio do vôo para fora do chão raso das certezas racionais e do conhecido e do cognoscível. O triunfo de Mohammed é celebrado em vários símbolos islâmicos como o Crescente: a Lua cujo eclipse ele previra com sucesso e exclusividade, e portanto um símbolo do triunfo da Mística sobre a Razão através do imenso Poder potencial do incognoscível. Nos Mysteria de Tartessos, a Deusa-Lua Ioa fornecia, no ato iniciatório, a febre e o êxtase místico, o primeiro portal rumo à realidade transcendente no tempo imanente, e em vários seres sobrenaturais (ou seja, alquimicamente transmutados) do folclore popular, a vida ativa se dava à noite, sob o poder da Lua.
 

                         E é por esta faculdade de iluminação interior e ascese iniciática que os dórios deram a essa Deusa-Lua iniciática o nome de Selanna, Selene na Grécia clássica, nome proveniente de ‘selás’: brilho, claridade – a clareza de percepção quando as portas da intuição se abrem e todo o conteúdo latente da Esfera de Sombra é acessado e consultado.

                Um Xamã, neste sentido, é uma personalidade predominantemente lunar. Ao contrário do sacerdote e do místico, que elaboram ritos e dogmas com base em doutrinas aprendidas de superiores hierárquicos ou ordens institucionalizadas, cada Xamã tem um aprendizado único, jejuando na floresta: ninguém conhece o culto que ele oficia, que Deuses ou forças invoca, seus pensamentos e teologias – antes, ele apreende todo o conhecimento necessário para ‘xamanizar’ a partir de si mesmo e de sua experiência de jejum, meditação, visões, sonhos e rituais espontâneos e improvisados conforme a necessidade.

                Enquanto o sacerdócio pertence a uma forma de espiritualidade solar, racionalizada e dogmática, consciente de si mesma e de sua forma, o xamanismo é uma via totalmente lunar (assim como a Gnosis ideal) no sentido de que todo o seu corpo de conhecimento é intuído e buscado nas profundezas da mente, forjado pela experiência e raramente definível ou explicável para qualquer outro. No vídeo abaixo, por exemplo, temos um exemplo de uma espécie de canto, de invocação, típico do xamanismo, que não é absolutamente aprendido nem treinado, mas extraído inteiramente da mente inconsciente:



                A capacidade para buscar dentro de si uma expressão, uma vontade, na forma de canto, de dança, de arte em geral, é associada à Lua astrológica e seu riquíssimo acervo do inconsciente microcósmico. Por isso nas interpretações convencionais a Lua indica uma sensibilidade e um gosto pelas artes, e processos similares. Mística, espiritualidade, artes, todos conteúdos sêmicos, obedecem a um mesmo impulso primordial de representar e racionalizar os símbolos que saltam do subconsciente e se fazem visíveis à esfera racional!

                Tudo isto somado, a Lua representa um poder e uma influência absolutos na mente de cada um, pois rege o poço de pensamentos potenciais que é o subconsciente, a partir de onde se constrói o pensamento racional e, portanto, a personalidade. Mas mais do que isso, compreender a Lua de cada um pode nos ajudar a compreender a personalidade quando em crise ou colapso, quando a razão se debilita e a natureza interior é demonstrada, e além disso, auxilia na compreensão dos pendores espirituais de cada indivíduo – onde e como há a necessidade de se desprender do cognoscível e mergulhar no abismo de Si Mesmo.





 "Três coisas não podem mais ser escondidas: o Sol, a Lua, e a Verdade".
 - Siddharta Gautama





Ennoia, Isaria,
Aus der Lichte der Mond
Aus der Dunkel der Nacht
Nahst du dich in deiner Macht