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"[...] cá entre nós, isto é uma parábola: um bom astrônomo saberá ler nas estrelas sinais e símiles que nos permitem silenciar muitas coisas." (F.W. Nietzsche)

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Marte Astrológico

Marte Astrológico


 - “Podem prender minhas pernas, mas nem o próprio Zeus pode tirar de mim meu livre arbítrio” - Epíteto

Brilhando em noites claras como um diamante de sangue nos céus está Marte, o primeiro astro a estar mais longe do Sol do que a própria Terra – um aviso aos viajantes: a partir deste ponto, deixamos o mundo claro da superfície em definitivo (a Lua ainda possuía características “emersas”, como um veículo que levava da esfera de sombra à esfera de luz) e começamos a adentrar o mundo subterrâneo da psique, com forças cada vez mais inconscientes e aterradoras. É o último planeta sólido – daqui por diante entramos na matéria sutil e em reinos mais etéreos...

            Na Roma primitiva, Marte era chamado Mavors, de origem proto-indo-ariana M̥rēs, lutar ou batalhar: na Grécia, o termo se tornou marnamai, com o mesmo significado, e no dialeto Punjabi da índia, maarna significa atingir, matar: mesmo no inglês moderno, temos a palavra maim com significado igual.

            A etimologia dá uma pista sobre a força violenta, ativa e irruptora representada pela esfera de Marte; ela é necessária como instinto de sobrevivência e sexual, mas no cerne da questão da importância dessa esfera astral está a questão do agir: até agora, no caminho do Sol – Lua – Mercúrio - Vênus, temos a assimilação dos conteúdos pela mente, a emergência do conteúdo da esfera de sombra, sua racionalização e classificação conforme o grau de ligação do ente percebido pelo Ego, respectivamente.


            A julgar por estas quatro forças, o ser humano seria um grande acumulador passivo de conteúdos mentais. Entretanto, a existência não contempla apenas a assimilação, mas a inter-ação e transformação da realidade circundante, e Marte fornece esse ímpeto conquistador  e transformador. Sendo um Deus marcial, não se deve entender que Marte rege apenas a guerra como embate de forças armadas, mas seu sentido é mais amplo: Ares/Marte incorpora o esforço de guerra humano pela intervenção e transformação de sua realidade, todas as situações em que é próprio ser duro, combativo, violento: em uma palavra, uma força de renovação.

            Tanto que a etimologia de Ares é o termo dórico ara, significando imprecação, ruína, maldição, banimento. Todas forças saudáveis e necessárias da vida – quando o criador hindu, Prajapati, começou a se angustiar com o acúmulo de criações cinzentas e esgotadas, Shiva lhe propôs ter a piedade de deixar que as criações morressem e se renovassem, e assim ele vibrou e materializou a bela dama de escarlate, Mrtyu, a Morte, que peregrina pelo mundo ceifando aquilo que já carece de potência interior, dando paz a tudo o que é combalido e esgotado.

            E se todo o marcial pode ser sintetizado na idéia de transformação e renovação, essa idéia arquetípica manifesta-se em dois pares de opostos complementares, que explicam o fato de Marte reger os signos de Áries, o signo do Jasão que ousou e arriscou tudo pelo velocino de ouro, a força pura da ação, e Escorpião, o pequeno porém venenoso assassino de Órion enviado por Gaia como uma evocação da própria essência do intenso e do letal.

            Do lado criativo, Marte se manifesta sempre que necessitamos de coragem para uma empreitada, na forma do ímpeto da ação, da ira e da impulsividade tão necessária aos instintos de sobrevivência. Marte é quem faz nossos olhos brilharem e as mãos avançarem atrevidas para tomar ou repelir aquilo que se deseja possuir ou destruir. É a essência da mão-na-massa.

            Aqui é interessante fazer notar que, ao contrário do Marte romano, um deus militar sério e digno, o Ares grego era tido como um bruto, perigoso e não muito inteligente: eles o evocavam com sua carruagem alada puxada por Phobos e Deimos, o Medo e o Terror, mas temendo os efeitos arrasadores de sua presença, que inspirava um impulso violento impossível de saciar. Além disso, o famoso amante de Aphrodite (a Ação sempre é guiada pela inspiração da Beleza) foi diversas vezes posto em situações vergonhosas ao persegui-la e certa vez caiu numa armadilha de Hephaistus e foi exposto ao ridículo perante todo o Olimpo: para entender esse arquétipo, basta pensar nos indivíduos que arruínam e são arruinados por se renderem ao impulso de saciar um desejo – estupradores, assassinos, cleptomaníacos e compulsivos obsessivos em geral. O temor grego de Ares vem da necessidade de, mantendo o desejo, frear o impulso e agir com estratégia e inteligência.

            Do lado escorpiano de morte/regeneração, Marte corporifica a coragem de destruir e reconstruir, quebrando os grilhões do apego e a tensão dramática posta sobre um fato, um ente, uma idéia: em Esparta, as crianças que iniciariam os treinamentos de guerra cumpriam um ritual noturno no qual sacrificavam um filhote de cachorro a Enyalios, a versão espartana mais ctônica, obscura e subterrânea de Ares, provando sua coragem para o desapego e a dureza, qualidades que toda sua vida futura exigiria. Também Marte representa a coragem de se sacrificar, ou de sacrificar algo de si, para a realização de algo importante, como os Kamikazes japoneses que, efetivamente, se tornaram Deuses do vento por seu sacrifício (como seus comandantes prometeram), ou o famoso mensageiro que levou a Atenas a notícia da vitória grega em Maratona e morreu da exaustão subseqüente.

            No entendimento popular, Vênus é associado às mulheres – sem dúvida a grande inspiração de beleza na civilização humana e as protetoras psíquicas e telúricas do cerco familiar (alegoricamente, as mulheres nórdicas andavam com molhos de chaves na cintura, pois elas controlavam as portas do lar e da aldeia), assim como Marte é associado ao masculino, pois é uma premissa que cabe ao homem, arquetipicamente dizendo, a interação transformadora com o meio e o eterno jogo de queda de braço com a natureza e a vida: cabe aos homens a iniciativa, a coragem, e todas as ações das quais se haure forças da Esfera de Marte, e também o saber direcionar os impulsos e reações para uma melhor canalização de forças, pois se cedêssemos sem resistência às pulsões subconscientes da Lua seríamos pouco mais que animais cultos.

            Nisto cabe uma chave importante para um bom aproveitamento da Esfera de Marte: seu poder de ação, domínio, morte e transformação vale tanto para o mundo externo quanto para o próprio mundo psíquico: vem de Marte a força que rompe vícios, revoluciona pensamentos e comportamentos, e nos “chacoalha” quando aprendemos uma lição dura que exige mudança imediata de direção. Podemos pensar nesta Esfera como uma força plástica da psique, que molda a mesma de acordo com alguma vontade consciente. Por vezes se confunde, por ter natureza similar, àquela fonte de energia espiritual infinita que brota da ira e que os místicos germanos chamaram Vril.    

           
Em resumo, a esfera de Marte possui uma qualidade vital para a vida humana, segundo a qual não aceitamos a realidade das idéias e fatos de forma passiva, mas podemos destruir, mover, alterar, desmontar e remontar suas partes de acordo com nossas aspirações ou necessidades. É o instinto de sobrevivência, o instinto sexual, a coragem, a orientação para a ação, o ímpeto, a Vontade expressa de não ceder tiranicamente aos impulsos do subconsciente, de exercer auto-controle.

            E, como expressão de Vontade, Marte possui uma chave crucial para a superação do meramente-humano e a via da Übermenschheit. Se temos o poder de não apenas seguir a corrente do que Nimrod de Rosario chama de Caminho Elix (a evolução temporal inexorável de acordo com um plano arquetípico), mas podemos a cada instante fazer escolhas de caminhos a seguir, que por esse tão louvado livre-arbítrio sejam dadas graças a Marte, a pura força volitiva que é a única capaz de nos fazer cada vez mais livres!

           
             
SÊ UNO COM O ETERNO
DOMINA TEU UNIVERSO INTERIOR E DOMINARÁS O UNIVERSO
O ESPÍRITO CRIATIVO SEMPRE VENCE
A FORÇA DE TEU ESPÍRITO TE FARÁ LIVRE







Ennoia, Isaria,
Aus der Lichte der Mond
Aus der Dunkel der Nacht
Nahst du dich in deiner Macht

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