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"[...] cá entre nós, isto é uma parábola: um bom astrônomo saberá ler nas estrelas sinais e símiles que nos permitem silenciar muitas coisas." (F.W. Nietzsche)

domingo, 25 de setembro de 2011

Vênus Astrológica

Vênus Astrológica

Ella guardava suso, ed io in lei” [Ela olhava para cima, e eu para ela]
            - Dante Alighieri


            Um astrólogo notou certa vez, ironicamente, que sua página sobre Vênus era a segunda mais visitada, perdendo apenas para uma dissertação sobre o signo de Escorpião e o sexo. Vênus, denominação romana para a deusa grega Aphrodite, vem do termo proto-indo-europeu –wen: desejar, cobiçar, buscar, ser satisfeito (notar a conexão com o sânscrito vanas, desejar, e com o saxão wynn, júbilo, alegria – o mesmo significado exotérico da Runa Wend ou Wunjo). Dá para perceber a importância superlativa dela na vida diária de uma humanidade que deseja de maneira cada vez mais sedenta encontrar um sentido de felicidade.
            Algumas vozes já se ergueram para denunciar o fato da deusa Vênus estar nos dias de hoje extremamente frustrada e magoada com sua humanidade – nas palavras de Dana Gerhardt, “não há no mundo de hoje sequer UM templo honesto para ela”; por milênios a superestrutura cultural da humanidade foi modelada pelos sacerdotes, tanto no ocidente quanto no oriente, do judaico-cristianismo, do lamaísmo, e de outras forças religiosas que veneram o criador masculino, antifeminino e beirando mesmo a misoginia e o homossexualismo no seu repúdio a mulheres (não nos esqueçamos do mito Duska do Tibet, que conta que esta casta de monges nasceu do fruto da união do criador com um sacerdote por quem se apaixonara... e não nos esqueçamos também que a ‘esposa’ de Jehova é sua congregação, sua Ecclesia, composta de sacerdotes... homens! Nos termos mendazes e cruamente sinceros de São Paulo, o grande odiador do feminino, “Mulier taceat ad ecclesiam”: que a mulher se cale na igreja!).
            Vamos aplicar aqui uma lente de aumento (e depois, um microscópio) para enxergar a questão a fundo: Vênus, a Deusa aparentemente graciosa e jovial, leve, descompromissada, risonha e promíscua, senhora dos prazeres dos sentidos e do amor (tanto eidético quanto sexual) – não deveria ela estar mais contente numa época onde os valores morais restritivos do judaico-cristianismo parecem ruir? Onde o prazer dos sentidos é buscado a cada instante?
            Aphrodite é muito, muito mais do que isso. Mas vamos por enquanto aceitar essa visão adolescente de uma Deusa que sabe apenas o prazer e a beleza. Sabe-se buscar e fruir o prazer, hoje em dia? Primeiro há toda uma rede de precondicionamentos morais, fruto dos últimos milênios de influência cultural do sacerdócio monoteísta saturnino: quando se busca o prazer, deve ser em segredo, esgueirando-se pelos cantos como ratos, pois a satisfação mera e simples não pode ser assumida sem ser julgada indecorosa, indecente, etc, etc, etc – perdeu-se a coragem de assumir o que se quer, de ser um “saudável monstro dos trópicos” como César Bórgia ou Calígula, homens demonizados apenas por serem extremamente livres para se submeterem ao julgamento moral do sacerdócio.
            E aqui estamos falando de grandes e pequenas coisas, do prazer de uma orgia ou da conquista de algo caro após anos de luta árdua, a pequenos prazeres como achar e comprar um pingente do seu gosto, ou relembrar o gosto de um doce favorito da infância. Vênus preside sobre todas as coisas boas e agradáveis da vida, uma barra de chocolate, uma risada com pessoas queridas ao redor, o toque de um tecido fino. A humanidade busca sofregamente a auto-gratificação dos sentidos, porém soterrada por premissas morais e por pressões sociais que colocam o valor do prazer acima do valor do próprio Ego – de fato, cria-se uma expectativa exorbitante sobre o prazer, que vem de uma prévia diminuição do valor do Eu (basta ver para isso todo o discurso cristão sobre os “vermezinhos de Jacó”, sobre humilhar-se no pó etc, etc, ou o ditado chinês que se ensina para as crianças de berço, “torna pequeno o teu coração”, e toda a baboseira new-age esotérica de “somos pequenos perto do cosmo”, “somos um grão de poeira no universo”, etc, etc, etc).
            A humanidade hoje é infeliz e alquebrada em boa parte por conta desta diminuição sistemática do valor do Ego. Quando se busca o prazer – num relacionamento amoroso, na estética, nas posses materiais, essa expectativa fantasiosa de que “isso trará minha felicidade” está fadada a se tornar vazia, porque já parte da premissa de que você, eu, cada um, não é nada, não tem valor, precisa de complementação externa. Usando as excelentes palavras da sra. Gerhardt, “cada vez que agimos assim, estamos enxotando nossa Vênus para as ruas, com uma tigela de mendigo nas mãos”. E nem é preciso dizer que esmola não enche a barriga de ninguém.

            Vamos começar a nos aproximar, vagamente, de Vênus. Olhem seu glifo: o círculo, representando o Espírito, sobre a cruz da matéria. Conectados, mas sem que um invada ao outro. “Colados” por uma superfície de contato. Existe um duplo movimento aqui, de cima para baixo e de baixo para cima. No movimento decadente, o Espírito perde seu centro, seu Ego, e vai buscar seu prazer, seu sentido, na matéria. No movimento ascendente, o Espírito sublima a matéria, depois de usá-la egoicamente para si e transcende-la. E muita coisa cabe aqui. Seus signos são Taurus, o Touro, mais focado na parte material (mas também psicológica) do desejo de segurança e estabilidade, e Libra, a Balança, que representa o lado mais espiritual e refinado do gosto artístico, da eterna busca pelo belo.

            A mágoa de Vênus é que a humanidade manchou e degradou o prazer, porque perdeu seu centro, seu Ego, e busca o prazer não para desfrute, não para a afirmação da Vontade própria como sentido da existência, mas como uma muleta provisória para se manter de pé: mesmo buscar o prazer hoje se tornou um sofrimento. O objetivo do prazer não é ele em si – o hedonista saudável não é um glutão sôfrego, mas usa a perseguição e captura do prazer como um simbolismo do imperativo Fiat Voluntas Mea: “faça-se a MINHA vontade sobre esta Terra”, numa atitude de desafio ao sofrimento do Karma e de descoberta gradativa das próprias capacidades de conquista e mesmo de fruição, numa espiritualização em contínuo refinamento dos sentidos e das artes.

            A partir desta compreensão inicia-se o movimento ascendente em Vênus: os prazeres são parte importante da vida, crucial até, desde que eles sirvam ao Ego, a nós, e não o ego dependendo de amores, posses, dinheiro, prestígio, estima alheia para se definir. Vênus nos instiga, sedutoramente, a tomar posse da nossa vida e assumir plena responsabilidade por ela, a organizar do que dispomos ao nosso redor, e usar o que nos agrada, não ser usado pelas coisas. Quando nosso Ego (Espírito, Círculo) é o centro da figura, e a cruz da matéria é um mero apêndice e instrumento, estamos em condições de nos tornar seres fortes e plenos.

            Mas vamos mais fundo ainda. Vênus é sim a regente de todo o agradável, de tudo o que nos faz felizes, mas o que é que buscamos? Dinheiro? Sexo? Itens caros? A Arte? Um ideal político? Em níveis mais conscientes, ou menos conscientes, a nossa busca está condicionada a algo etéreo, algo ideal, que Platão descreveu como “o espelho de nossa própria Alma”: se temos em conta o antigo mito dos gigantes bicéfalos que foram repartidos ao meio pelos deuses, descobrimos que a experiência humana é um eterno ser-pela-metade: toda Estética, toda busca pelo prazer é uma busca profunda pela metade-de-si-mesmo perdida, por aquilo que nos completa e eleva. Esta é a força e o significado de Vênus em um mapa: o que nos agrada, e portanto, o que buscamos para nossa plenitude? 

E cá encontramos um significado mais profundo da Vênus astrológica: sua posição e configuração no mapa se traduzem como um Norte eidético, uma direção para a qual estendemos nosso ideal de felicidade, um ideal que nos inspira a eternamente persegui-lo, dançando tentadoramente sempre um passo à nossa frente como a sedutriz sorridente que é Venus, nisto se aproximando ao Eterno-Feminino que nos inspira e eleva (nas palavras de Goethe, “Das Ewig-Weibliche zieht uns hinan”: o Eterno-Feminino atrai-nos para cima, ou nas palavras excelentes de Dante que abrem e resumem este artigo). Sua regência do signo de Libra é compreensível, como a força que representa aquele eterno ideal platônico de beleza que perseguimos sem tocar ao longo da vida: astronomicamente, Venus é a Estrela da Manhã ou a Estrela Vespertina, o ponto mais brilhante dos céus noturnos, ao lado da Lua, que orienta os navegadores.


Mais do que isso ainda, Aphrodite é a Deusa para quem os troianos rezaram quando os exércitos gregos se postaram às suas muralhas. Pergunta-se o que deu nos troianos, para pedir ajuda a uma entidade delicada e feminina, senhora dos prazeres e das artes, para defender a cidade, no lugar de entidades mais belicosas como, digamos, Ares, ou o próprio Poseidon que era patrono da cidade. Ou, se queriam uma Deusa, por que não Atena, a estratega que já nasceu armada da mente de Zeus – é algo a se perguntar.

Na realidade, Atena é uma Deusa belicosa, mas ofensiva. Ela conhece a iniciativa, o ataque, as cargas de cavalaria e as manobras estratégicas em campo aberto. Aphrodite é sua complementação militar como Deusa da Citadela, senhora das armadilhas e das muralhas, organizadora da defesa dos cercos e das cidades. Isso é inusitado (não tanto, se pensarmos em sua regência do signo de Touro como um signo obcecado por segurança).

Sim, Aphrodite possui uma manifestação terrífica, belicosa, conhecida dos troianos e também venerada em Corinto, como Kythereia, a defensora dos cercos – traduzindo isto em termos astrológicos, Venus é sim tudo o que nos inspira e nos eleva, nossos prazeres e ideais de ser, e também a força que protege nosso senso de individualidade frente às crises de uma vida que teima em contrariar sistematicamente nossos esforços e desejos; através daquilo que desejamos e aspiramos é que organizamos a idéia do que é nosso Self, do que consiste nossa individualidade e nosso ser-único no Universo, uma idéia que defendemos e fazemos persistir apesar de todos os reveses, de todos os esforços do Cosmos para dissolver nosso Ego numa consciência unificada universal: se é um lado da Deusa que foi oculto e soterrado por mais de dois milênios, é porque o verdadeiro Amor em Armas é talvez a força mais terrível que um ser humano possa empregar, e cabe aos sacerdotes a missão sistemática de ocultar e monopolizar as fontes do poder interno da psique humana.

Quem já não teve crises de personalidade, quando não se sabe mais aquilo que o define e se duvida dos próprios ideais como válidos que atire a primeira pedra. Para estes eu pergunto – se em algum momento após a crise, em meio à vontade de não existir mais, não somos invadidos por uma força reanimadora, uma nova afirmação de nossos ideais e desejos mais profundos, uma nova ou renovada afirmação de que SOMOS, e devemos continuar persistindo – quem já sentiu essa força renovadora do desejo, essa pulsão súbita do ânimo, pode sentir-se privilegiado, pois a doce e delicada Deusa saltou à sua frente para defendê-lo, com seu escudo invencível, de todas as forças da loucura e da dissolução da consciência – com a eterna inspiração daquilo que nos mantém vivos e fortes.

Encerro com uma música de mais de novecentos anos de idade, que mostra como funciona Vênus dentro da psique: o rapport, o maravilhar-se, a inspiração, e a perseguição sem fim de uma beleza recém-percebida, que insufla a existência de sentido e coragem valorosa (letra abaixo):





O rico esplendor dos baixios e colinas,
Dos bosques e rios e férteis campos,
Penetraram em mim, dissiparam meus pesares,
Expulsaram meu luto, esmagaram minha dor
Eu segui a célere corrente do rio
Minha mente transbordando um exultar
E quanto mais fundo adentrava aquele idílio aquoso
Mais e mais meu coração tamborilava
Com a força de um júbilo arrasador
Pois Fortuna tende a, o que quer que nos mande,
Cobrar primeiro as circunstâncias em dividendos
E ainda mais, e mais, e ainda mais

Dado todo o tempo do mundo
Eu não poderia explicar o que encontrei ali
Um coração terreno não tem suficiente terreno
Para sentir um décimo dos prazeres divinos
Então eu pensei que o próprio Paraíso
Estivesse ali, se estendendo pelo outro lado,
E pensei que a água talvez fosse um truque
Separando dois jardins de delícias,
E supus que a Cidade Celestial ficasse
Logo ali do outro lado do vale
Mas a água era funda, e eu não ousei atravessar
Embora o desejasse mais, e mais e ainda mais

Mais e mais e ainda mais,
Ansiava por ver o que estava além
Pois embora fosse belo aonde eu estava,
Tão mais amável era o outro lado
Eu busquei um ponto seguro de travessia
Mas quanto mais olhava, mais perigos encontrava
Eu sabia que não deveria hesitar
Diante de qualquer dificuldade mundana
Aonde os prazeres eram tão intensamente deliciosos
Então uma nova idéia se apoderou do pensamento
E a maravilha em minha mente cresceu
Mais e mais e ainda mais.

Ennoia, Isaria,
Aus der Lichte der Mond
Aus der Dunkel der Nacht
Nahst du dich in deiner Macht

sábado, 17 de setembro de 2011

Mercúrio Astrológico


Mercúrio Astrológico

“O mundo é tecido em duas dimensões principais, rigor matemático e harmonia musical; ambos estão unidos numa homogeneidade superior que pertence à própria incomensurabilidade do Sagrado.”


- Frithjof Schuon, "As Raízes da Condição Humana"

Para os alquimistas medievais, o mercúrio era o metal que representava a dualidade. Líquido e metálico, matéria e Espírito, quente e frio – entretanto, longe de representar o Chaosium que se estende de forma irruptora em todas as direções, o Mercúrio astrológico é a força que lida com todas as dualidades e pontas soltas geradas pela grande (e não muito inteligente) força motriz da Vida, o Sol, e as une em um todo coerente e sólido.

Basta lembrar de Hermes, Mercúrio para os Romanos, o deus-mensageiro, de pensamento e fala rápidos, e seu caduceu com duas serpentes entrelaçadas. Hermes é o deus do inesperado, da coincidência, da sorte – por isso ligado muitas vezes a comerciantes e trapaceiros em geral – deus da fala e do silêncio, da eloqüência, do discurso que convence e conduz, dos enganos e da dialética, o deus irônico e alciônico que observa a todos os perdidos e confusos a partir de cada bifurcação e encruzilhada.


Hermes é, num sentido mais imediato e material, o deus que se encontra nas encruzilhadas, sempre com um conselho enigmático, tornando fluido o que era fixo, dissolvendo as certezas mal fundamentadas, e introduzindo aquele fervilhar confuso do cérebro sempre que se descobre um fato ou uma perspectiva nunca antes considerados (sua oitava superior, neste caso, seria Hécate, que exerce a mesma função em planos e circunstâncias mais transcedentais – mas falaremos a respeito quando terminarmos de percorrer o caminho até Saturno, e entrarmos no plano das forças transcedentais da psique).

Segundo o dicionário etimológico de Francis E. Valpy, Mercúrio não é uma palavra grega ou latina, mas gótica (n.a. dos antigos Godos, povos germanos que habitavam à época o sul da Alemanha, Áustria, partes da Eslováquia e Hungria, e que na Dácia tinham contatos com os gregos): merkia, um verbo que podia significar coisas como cortar lenha, trabalhar o metal, contar, enumerar, calcular ou prever – todas as atividades, em síntese, onde se refina e racionaliza os processos brutos, onde se apreende o fenomênico através da razão. Essa noção sobreviveu no alemão moderno de forma mais ou menos vaga, na forma do verbo merken – lembrar-se.

Mas falávamos do caduceu... antes de me perder em milhares de outros pensamentos e considerações (como é comum acontecer nas circunstâncias regidas por Mercúrio). Como na observação corretíssima de Schuon que abriu este artigo, a constituição dos entes é dual – entre o apreensível e o arquetípico, o físico e o astral, o matemático e o harmônico, enfim, chame-se sob que perspectiva desejar, existe um claro jogo de espelho na constituição de cada coisa apreendida pela nossa experiência (para quem tenha a delicadeza e a profundeza de notar), pela constituição fractal do Universo que repete os mesmos arquétipos em infinitas combinações, em projeções sempre imperfeitas de uma idéia (entelequia) em cuja direção tudo ruma.

Nossa própria apreensão das coisas, condicionada pelo Ego (sempre nos perguntamos “o que é isto para MIM?”; a questão “o que é isto, em si?” é virtualmente inapreensível para a mente humana) faz com que surjam dualidades e paradoxos, que Mercúrio vem unir e costurar na forma de concepções racionais – Mercúrio-Hermes é o deus dos paradoxos, das contradições, das quais duas são bem interessantes:

1) Mercúrio é o Deus dos donos de lojas e comerciantes honestos, e ao mesmo tempo, é o deus do submundo dos pequenos criminosos – ladrões, falsificadores, golpistas, batedores de carteiras, aliciadores (em oposição a Plutão, que tem influência nos crimes mais “pesados” e chocantes)... aonde termina o comércio honesto e se inicia o engano? O próprio vender algo não exige tanto refinamento e maquiavelismo quanto o de um golpista? Os dois extremos da atividade intelectual e gregária da comunicação, da malícia, da dialética e da arte de convencer se tocam na sua dependência da rápida organização de idéias e discursos que Mercúrio proporciona. Seria todo convencer e ser convencido, toda a comunicação humana, toda aliança e agrupamento e contrato – uma desonestidade em relação ao Ego próprio?

2) Em todo lar grego, dois elementos eram praticamente uma constante: um pilar na entrada dedicado a Hermes, e o fogo para aquecer/cozinhar dedicado a Héstia, a deusa a quem as virgens vestais eram consagradas. Se pensamos na aparente contradição entre essas duas deidades – o viajante sempre na estrada, curioso, rápido, ligado ao Ar (Gemini) e a dona do lar, que centraliza e organiza, ligada à Terra, crítica, prática, racional, detalhista (Virgo), temos os dois signos regidos por Mercúrio. Dois lados da mesma moeda.

Antes da introdução dos planetas trans-saturninos, dos doze signos, um era regido pelo Sol (Leo), um regido pela Lua (Cancer), e os outros dez eram regidos par a par pelos cinco planetas restantes, constituindo parelhas arquetípicas ou pares de opostos ideais, como os “lados de uma mesma moeda” – a idéia na astrologia ainda é válida, mas quando os planetas gasosos entram em jogo, precisamos também considerar que o terreno de experiências humanas experimentado além de saturno é outro, mais etéreo, mais ilógico, mais espiritual em todos os sentidos. O que não anula as oposições, mas introduz além da oposição horizontal uma outra questão vertical.

Podemos aprofundar ainda a contradição entre os dois signos apadrinhados por Mercúrio, Gemini (“Os Gêmeos”) e Virgo (“A Virgem”). Enquanto o primeiro é o comerciante e publicitário nato, aberto e sociável, comunicador, o segundo é crítico, detalhista e fechado em si, introvertido até o último; dois lados do mesmo processo intelectual, sem dúvida, e a origem da oposição introvertido/extrovertido de tipologias psicológicas como o MBTI (indicador de tipos de Myers-Briggs... dê um google nessa sigla, vale a pena); o fato é que Mercúrio, três vezes por ano, entra em movimento retrógrado – ou seja, parece estar andando “para trás” no zodíaco. Na verdade este efeito é causado pela rotação da Terra, mais ou menos quando você vê um carro, na mesma direção que você, “andar para trás” porque você acelerou mais do que ele, ou ele desacelerou.


Quando uma pessoa tem Mercúrio retrógrado em seu mapa natal, ela tenderá a ter dificuldades de comunicação, e preferirá pensar mil vezes antes de dizer, tendo um forte foco reflexivo e introspectivo, uma atenção especial ao passado e uma forte memória. Com Mercúrio retrógrado no mapa de um evento ou circunstância, a comunicação pode simplesmente não se estabelecer, havendo mal-entendidos e ambigüidade, idéias confusas ou mal expressadas, pois é natural que, às vezes, a aceleração extrema que Mercúrio impacta nos nossos pensamentos faz com que simplesmente seja difícil colocar esse turbilhão de idéias em uma ordem coerente e lógica. É necessário buscar, referente à razão, um meio-termo entre o criticismo detalhista e a confusão fervilhante de novas idéias e descobertas, entre o metal e o líquido, entre o fixo e o fluido, e a convergência das serpentes no caduceu mostra o aperfeiçoamento no uso da mente, a partir do momento que aceitamos e sincretizamos o paradoxal, e caminhamos verticalmente entre os extremos.

Voltando agora ao caduceu, já que o mencionamos acima (droga, me perdi de novo!), num nível imediato ele significa justamente o “costurar” uma visão, uma compreensão, através do entrelaçamento de princípios opostos e sua fusão em um algo compreensível – o Alexipharmacon, Medicina Universalis, a cura de todos os males, destilado da boca de ambas as serpentes simultaneamente, ou falando de maneira clara, a Razão e o raciocínio como as formas de dissipar a nebulosidade do incompreensível e deitar uma âncora firme em terra para as nossas experiências (o que é verdadeiro, mas apenas para o âmbito do estritamente mundano).


Prestemos a atenção devida ao glifo de Mercúrio: no centro o Sol, projetando o existente; acima dele, duas serpentes opostas (o paradoxo, o dual, o incompreensível), e abaixo a cruz, símbolo da Matéria e do mundano. A atividade de Mercúrio é a de codificar, sistematizar, organizar e ligar em rede o que o Sol (Ego) apreende, sendo portanto a atividade dual

indutora/dedutora que chamamos de “Racional” ou “Intelectual” e que faz com que as experiências apreendidas não sejam isoladas umas das outras (como aconteceria se só o Sol existisse) mas se interliguem em categorias, causas, efeitos, semelhanças, similaridades, oposições, etc, etc, etc.

Sem Mercúrio, saberíamos apenas que vermelho é vermelho e que azul é azul, não teríamos a categoria “cores”, frio ou quente, intenso ou suave, e todas as miríades de categorizações que povoam nosso pensar, e que multiplicam e interligam nossas experiências sensoriais por milhares de vezes a força original – quantos LIVROS poderiam ser escritos a partir do Discurso da Flor do Buda (o “discurso” consistiu no ato dele pegar uma flor do chão e mostra-la aos discípulos), um gesto que pode ser investigado e remexido e decomposto em quase infinitos simbolismos e significados ocultos muito além do óbvio!acontecendo, como que numa busca sôfrega por capturar dados para poderem unir suas próprias pontas soltas, seja essa preocupação consciente ou não. E é a consciência da multiplicidade infinita de significados e nuances e conexões que torna as pessoas de mercúrio vistas pelos outros como as mais intelectuais e curiosas, mas igualmente as mais frenéticas, insones, às vezes neuróticas e incapazes de se concentrar em uma coisa só. Esse cartoon mostra bem como as pessoas de Mercúrio são vistas de fora:



Pensar, relacionar, categorizar e comparar, e após isto, comunicar e convencer os outros pela lógica e sentido claros do que você expôs, são atividades que requerem a malícia e a agilidade de Hermes, e o critério cuidadoso e higiênico de Héstia, indução e dedução respectivamente, que de acordo com Moyano e outros autores junguianos, são operações primárias do cérebro que se seguem automaticamente após a apreensão do ente – racionalizamos a coisa antes de racionalizar que racionalizamos! – o que explica Mercúrio ser o ente mais próximo do Sol (nos mapas geocêntricos, Mercúrio NUNCA está a mais de 27 graus de arco do Sol, porque à nossa distância ambos estão realmente próximos), e o que explica também o fato (al)químico do metal mercúrio somente aderir a metais preciosos como o Ouro (Sol): o que constitui a consciência pura, o Ouro alquímico, Mercúrio amalgama e junta, e por este motivo os mineradores poluíram as águas por séculos com Mercúrio, que se acumula e passa inalterado por água, carne e outras formas de matéria complexa, mas amalgama e se une aos metais preciosos e isolados – quem quiser que faça suas analogias e tire suas conclusões (com a ajuda de Hermes!), pois o fato de todas as nossas experiências poderem ser inter-relacionadas está na raiz da sábia afirmação de que tudo tem a ver com tudo - no fenomênico, não há pontas soltas, pois Mercúrio as une a todas umas com as outras.

"Então o jargão da alquimia foi criado, uma ilusão impenetrável para o vulgar com sua ganância por ouro, um idioma vivo só para o Verdadeiro discípulo de Hermes".

- Eliphas Levi, "De Dogme Rituel de la Haute Magie"




Ennoia, Isaria,
Aus der Lichte der Mond
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domingo, 4 de setembro de 2011

O Sol Astrológico



O Sol Astrológico

A partir das décadas de 60 e 70, com o impulso e subsídio da cultura new age popular, a astrologia dos signos solares ficou bastante popularizada, e até hoje alimenta os “horóscopos” e “previsões para o seu signo” de jornais e revistas diversos. Quando perguntam qual é o seu signo (e a maioria de nós ao menos decorou, mesmo os menos interessados, o “nosso signo”), na verdade questionam o nosso signo solar: olhando de onde você nasceu descrevendo um arco imaginário por onde o Sol percorre (inclusive à noite, quando o arco prossegue por “debaixo dos nossos pés”) temos a roda das 12 casas zodiacais, sendo que esse aro, essa roda, sempre cruza as 12 principais constelações que são os famosos Signos.

O trânsito completo do Sol ao longo do zodíaco dura um ano terrestre, então os nossos meses delimitam a passagem do Sol em cada um desses signos. Na realidade nosso calendário é uma criação social e não considera exatamente esse trânsito: ao invés do dia 1, o Sol entra em um novo signo a cada dia 21 (os solstícios e equinócios ocorrem em dias 21).

Embora a Astrologia seja muito, muito mais do que apenas a descrição genérica do signo solar, muitas vezes acontece de serem justamente estas características que mais se sobressaem, ou adquirem maior visibilidade externa, no indivíduo. Isto tem uma razão.

A função do Sol, no sistema solar físico, é ordenadora em todas as instâncias: a sua força gravitacional gera e estabiliza a órbita dos planetas, sua energia radiativa é a fonte de calor e de energia potencial para inúmeros fenômenos físicos e biológicos na superfície dos planetas, do crescimento de uma planta aos tornados e às células de convecção atmosféricas e oceânicas.

Diz uma antiga laude egípcia a Aton, o Deus Sol:


Mas na aurora, enquanto te levantas sobre o horizonte, e brilhas, disco solar, ao longo da tua jornada, rompes as trevas emitindo teus raios... Se te levantas, vive-se; se te pões, morre-se. Tu és a duração da própria vida; vive-se de ti. Os olhos contemplam, sem cessar, tua perfeição, até o ocaso; todo o trabalho pára quanto te pões no Ocidente.Enquanto te levantas, fazes crescer todas as coisas para o rei, e a pressa apodera-se de todos desde que organizaste o universo[...]

No que todos os que observaram o poder do Sol em ação fazem coro, do mais antigo xamã siberiano ao geocientista contemporâneo.

No nível fractal da nossa psique, o Sol engloba todas as forças organizadoras da consciência. Tudo o que pensamos, apreendemos e relacionamos, o fazemos não de maneira neutra – o pensar a “coisa em si” simplesmente não acontece – mas pensamos, aprendemos, julgamos e relacionamos e sentimos em relação a um núcleo de consciência, o Ego, ou, para usar uma terminologia junguiana ou gnóstica, o Self: o núcleo irredutível da Consciência anímica de Si Mesmo.


O Sol é a força aglutinadora das nossas experiências e aprendizados que, numa colcha de retalhos, constitui aquilo que chamamos nosso “Ego”, “Eu”, nossa personalidade consciente e aparente ou, usando um termo caro a nós jungianos e moyanistas, o Self anímico. Olhando com atenção o glifo ou símbolo representativo do Sol astrológico (e alquímico), vemos um círculo, que é uma junção de infinitos pontos que eqüidistam de um centro: o Sol organiza todas as nossas experiências e aprendizados pontuais em relação a um centro egóico. Assim, por exemplo, se pensamos dois entes distintos, nossa mãe e uma xícara, na grande maioria de nós a mãe vai ter mais importância, porque tem uma conexão mais forte com o nosso Self do que uma xícara.

Por essa forma de operar, o Sol é a grande força ordenadora, que organiza todas as experiências isoladas, todas as forças mentais – o intelecto, as emoções, os ideais, os medos, as ilusões e epifanias – em um maquinário coerente, sendo mesmo justo dizer que o Sol anima todas as forças psíquicas, pois sem o Self estaríamos reduzidos às trevas da subconsciência! Um exemplo interessante (e nada esotérico) que eu uso para ilustrar esse modus operandi é uma animação soviética sobre um programa de expansão da rede elétrica. (Quem não tiver paciência assista ao menos o trecho entre 0:49 e 3:11 minutos).

Numa imitação algo grosseira do Deus-Sol eslavo Svarog, o jovem revolucionário e sua trupe musical atravessam o campo, que parece morto e sem vida, espalhando a Luz (das lâmpadas) – e o efeito, interessante, é o de organizar a vida e o movimento em meio à escuridão da noite: escolas e bibliotecas abertas ao público, fábricas de tratores, o antigo moinho de vento é substituído por um celeiro moderno e, enfim, todas as forças institucionais se organizam e desenvolvem mutuamente. Graças à nova energia, o vídeo mostra uma série de possibilidades abertas a cada vilarejo, e da mesma forma, a energia do Ego irradiada através de nosso Sol astrológico permite que as demais forças interajam e se desenvolvam, gravitando em torno de um centro de forma ordenada.

E assim, nosso signo solar significa como organizamos nossas experiências, sob quais preferências, assim como a casa zodiacal na qual o Sol se apresenta no momento do nascimento influencia aquilo que tomamos como importante, como central nas nossas vidas, o que terá mais peso. Mais informações serão dadas quando eu finalizar a série de planetas e entrar nos signos e casas zodiacais, quando o signo solar será estudado com mais minúcia. O importante por ora será notar que a Astrologia diz muito mais do que o nosso “signo” (solar), na verdade possuímos todos os signos e todos os planetas em cada um de nós, organizado e correlacionado de uma maneira única: tão única, na verdade, que só será possível outra pessoa nascer com o mesmo mapa seu uma vez a cada 26.000 anos, ou o período que os Hindus fazem corresponder a um Manvantara, um Grande Ano Cósmico. Como uma falecida sábia enunciou repetidas vezes em seus escritos, tudo tem a ver com tudo.



Ennoia, Isaria,

Aus der Lichte der Mond

Aus der Dunkel der Nacht

Nahst du dich in deiner Macht

domingo, 31 de julho de 2011

O que é Astrologia?

O que é Astrologia?

Ou: como os Astros não determinam nada na sua vida

“Afirmou que os papéis de seu antepassado continham notáveis segredos do saber científico de tempos primevos, a maior parte em código [...] e no entanto, não tinham qualquer importância, salvo se relacionadas a um corpo de conhecimentos hoje totalmente ultrapassado;

de forma que sua apresentação imediata a um mundo equipado unicamente com a ciência moderna lhes tiraria toda a força e significado dramático e explicativo.” (H.P.Lovecraft, ‘O Caso de Charles Dexter Ward’)


Diferentes pessoas virão procurar uma página ou um livro de Astrologia por diversas razões.

Alguns talvez por curiosidade, meio distanciada (afinal de contas, é apenas uma superstição, não é? Superstições nunca se assumem – mas nunca se descartam), alguns por gosto por coisas “místicas em geral”... quem sabe, procura-se uma resposta para um problema, ou queira-se precaver contra algo, então! Sem contar os veteranos do meio, e Astrólogos profissionais passeando por sites do mesmo métier.

Seja como for, a quase totalidade das pessoas procura se informar sobre assuntos astrológicos baseadas em pelo menos uma de duas premissas:

1) Os Astros determinam sua personalidade; e

2) O movimento dos Astros tem ligação com fatos da sua vida cotidiana

Invariavelmente, frustrarei esta maioria, pois estas visões não somente estão distorcidas, mas obstruem a compreensão real do que é, de fato, a Astrologia.

O pensar antigo: blocos fundamentais da ciência Astrológica



De pouco ou nada adianta pensar com uma mente moderna sobre um ramo do conhecimento que se construiu com idéias, e com uma forma de pensar, que a ciência moderna não compreende mais.

Essa pré-explicação é meio longa, mas creio valer a pena!

Quando a Física e a Matemática se desenvolveram de forma rápida e certeira, ganhando precisão na previsão de fenômenos, o pensamento científico escolheu se dedicar exclusivamente à tarefa de prever, por indução a partir de uma teoria confirmada e testada, relações causais: um impacto causa a aceleração de um corpo, o aquecimento da temperatura média do mar causa desequilíbrios nos ecossistemas de corais, o movimento de rotação da Terra causa a formação de ciclones e anticiclones nas massas de ar atmosféricas.

O cientista antigo (porque não podemos deixar de pensar nos antigos filósofos e sacerdotes, até os mais remotos xamãs, como cientistas, geralmente guiados por uma paixão pelos fenômenos do mundo e incumbidos por suas sociedades de explicá-los satisfatoriamente) pensava de uma maneira distinta. Possuía-se muito do pensar da ciência moderna, e um algo mais que se perdeu no meio do caminho.

O fato básico assumido pela ciência antiga é que o mundo se organiza, fenômeno por fenômeno, coisa por coisa, num padrão matemático determinável, e que os fenômenos se organizam, dentro de si e entre si, de forma fractal.

Um fractal é uma “imagem”, digamos, que não importa o quanto se dê “zoom” pra menos ou pra mais, a imagem continuará a mesma.


Esse fractal extremamente simples consiste num galho se subdividindo em dois, em todos os níveis. Qualquer galho que se olhe, e a imagem será a mesma da original: um galho se dividindo em dois.

Um fractal é sempre determinado por um padrão repetido infinitamente em qualquer nível de detalhe, um padrão rígido e matemático, “programável” – por exemplo, esse fractal acima se gera num compilador qualquer com o código a seguir:



(define (fractal phase r w n k)

(if (> n 0)

(let* ((theta (* phase pi/3))

(x (* r (cos theta)))

(y (* r (sin theta)))

(r (* r k)))

(set-line-width w

(overlay (segment (vec x y))

(at x y (fractal (phase+1 phase)

r (* w k) (- n 1) k))

(at x y (fractal (phase-1 phase)

r (* w k) (- n 1) k)))))

null-box))

(define (make-fractal r w n)

(let* ((k 0.618)

(box (overlay (fractal 0 r w n k)

(fractal 2 r w n k)

(fractal 4 r w n k))))

(draw-to-file-for-png "fractal" box)))

(define pi (acos -1))

(define pi/3 (/ pi 3))

(define (phase+1 phase) (if (= phase 5) 0 (+ phase 1)))

(define (phase-1 phase) (if (= phase 0) 5 (- phase 1)))

(make-fractal (* points-per-inch 1.5) 2 9)

- Fonte: http://mumble.net/~jar/visuals/fractal.html


Ao longo da Antiguidade, as “mentes mais sensíveis do povo” (usando uma expressão do etnólogo Joseph Campbell) sabiam que tudo no Universo é um programa, um pedaço de código decifrável, e mais ainda, pouco original – podem-se identificar a partir de uns poucos padrões de fractais (essa foi a origem das cabalas, dos alfabetos mágicos – a busca por esses ‘códigos’ de fractais que fazem o software da existência rodar).

Então, além do ciclo

Observação dos fenômenos – indução de teorias (causais) e equações – dedução de casos particulares (forecasting),

havia o ciclo

Observação de padrões dentro dos fenômenos – indução de padrões arquetípicos – cruzamentos e comparações – inferência de verossimilhanças,

que hoje não se compreende mais: na realidade, quando se pensa, com nossa mente moderna, por exemplo na explicação dada na mitologia nórdica de que antes do mundo havia uma dimensão de fogo ao extremo sul do espaço (Muspellheim) e uma de gelo ao extremo norte (Niflheim), com o ‘vácuo fértil’ (Ginnunga-gap) ao meio, pensamos estupidamente: superstição interessante... assumimos que eles acreditavam de fato que um choque de fogo e gelo criou a matéria, ou que isso seria uma simples linguagem figurativa. Não se pensa nesse Genesis nórdico como uma explicação de um padrão da Física que se repete em todos os fenômenos: um diferencial de energia potencial entre dois pontos como o fato gerador do fenômeno em si (células de convecção, correntes elétricas, sinapses, ligações químicas, o que for). Se um diferencial de energia potencial “inicia” ou gera o fenômeno, o deslocamento, então a mesma dinâmica deve estar envolvida na criação do Todo, por analogia fractal: o que é verdade em um nível onde se tenha certo arquétipo subjacente, será

verdade em todos os níveis que tenham o MESMO arquétipo subjacente.

Que diabos a Astrologia tem com esse blábláblá?

Os Astrólogos se apoiaram firmemente neste procedimento, que é apropriado para casos onde identificar um padrão é mais importante do que obter uma precisão matemática.

A base de observações da Astrologia é o conjunto dos Astros (hm... óbvio), porém o que se observa e infere é muito diferente do que o senso comum assume. Um manual alemão do início do século 20 dava, por exemplo, uma explicação muito inteligente e racional, dizendo que a radiação solar que cada Planeta refletia e incidia sobre a Terra impactava era absorvida do ar pela primeira respiração do recém-nascido, impactando suas células e, portanto, sua forma futura de ser.

Do ponto da Astrologia original, defender uma posição desta é bem arriscado.

Afinal de contas, o planeta não influencia a pessoa em absolutamente nada. Porém, o funcionamento, a dinâmica, as propriedades e o trânsito daquele ente celeste possuem semelhanças arquetípicas com o funcionamento, a dinâmica, as propriedades e padrões de conexões da psique humana. Somos partes de um grande fractal, um grande código universal, e como vimos o que se observa em um ‘zoom’ se observa em infinitos outros: a órbita dos elétrons se assemelha à órbita dos planetas, e os trânsitos celestes possuem propriedades observadas que se assemelham à dinâmica inerente de certos processos mentais. Usando uma linguagem esotérica, sicut in caelum quod est in Terrae: assim no céu como na Terra – nada de novo sob o Sol.

Algumas coisas precisam ser consideradas aqui.

Primeiro, considere-se que não era tido em conta o Planeta Mercúrio, suponhamos, mas a Esfera de Mercúrio.

Esfera?

Na Física Aristotélica, os céus eram divididos em duas regiões: a infra-lunar ou Universo propriamente material (tendo a terra como centro de referência, o Sol e a Lua em “camadas” ou esferas acima da terra, e a supra-lunar ou Universo etéreo, supra-material, contendo o restante dos Astros que são menos pensados como planetas e mais como esferas de influência, considerando suas órbitas e propriedades (vide figura abaixo). Assumia-se que os astros em si percorriam os céus não por seu próprio movimento, mas porque estavam fixados em “esferas cristalinas” concêntricas à terra que giravam em torno de seu eixo, arrastando os astros consigo. Na verdade, isto é uma forma arcaica de dizer que as órbitas dos planetas, observadas de um ponto na terra, eram fixas de revolução em revolução.

Os cientistas antigos se preocuparam primeiro em fazer uma observação detalhada das órbitas dos astros, e então em observar padrões em seus movimentos e propriedades; notou-se a partir de certo ponto que havia uma semelhança marcante entre as propriedades dinâmicas gerais de uma Esfera (campo orbital) astral e uma Esfera psíquica (campo mental de influência) que passou a ser então correspondente à primeira.

Nota-se como nenhum astro tem influência direta sobre a personalidade ou a vida de ninguém, mas pode ser usado para inferências por ter padrões em alta verossimilhança com algum “departamento” da nossa psique, ou melhor dizendo, obedecem a um mesmo funcionamento arquetipicamente determinado. Este é o formato do “tijolo” com o qual se construiu, e se deve interpretar e entender, o pensamento astrológico.

Eu IA desenvolver um segmento inteiro comentando sobre a provável dúvida levantada pelo fato da física Aristotélica ter sido “detonada” pelo primeiro grande Mythbuster da História, Galileu. No lugar disso farei apenas duas provocações:

1) Leia-se Feyerabend... a Ciência é exata e correta apenas se se tomam seus axiomas, seus “vamos assumir que... ... ... seja verdadeiro”, como verdades; a aceitação de um certo pensamento científico não invalida as outras ciências ou propostas rivais, apenas a torna mais aceita socialmente por conveniência explicativa ou qualquer outra razão gregária ou de escopo explicativo. Dentro de seu contexto e escopo, todo programa científico é verdadeiro.

2) Assumindo que a validação de uma ciência está relacionada não apenas a seu poder explicativo, mas seu escopo e a conveniência ou funcionalidade de seus axiomas, não se pode supor que ganhamos muito com a ciência moderna em termos de forecasting e matematização (Lakatos por exemplo é radical na sua utilização da Física como parâmetro absoluto de todas as ciências) tanto quanto perdemos por nossa obsessão com as relações causais e temporais? Existem fenômenos atemporais, não-causais e sincrônicos, apenas deixamos de perceber isto quando deixamos de perceber os Arquétipos em interação na geratriz fractal dos fenômenos do universo.

Então, com isso a conclusão que quero produzir é que a Astrologia tem sido ridicularizada como ‘pré-ciência’ ou ‘superstição’ porque não se compreende de que forma, e de onde, ela tira suas afirmações. Na verdade, mais do que uma ciência, a Astrologia é uma semiótica, senão uma linguagem em si, como a Matemática: delinearei essa teoria a seguir.

A Astrologia como linguagem arquetípica

Pergunta-se: Qual o tesão de aprender uma ciência que “não explica nada”? Não é uma futilidade falar sobre a influência de Saturno no mapa se sabemos que o astro, Saturno, não age em absolutamente nada?

Na verdade, esta notícia não deve ser vista como desanimadora, afinal, Paracelsus já refutava que os Astros tivessem quaisquer influências na humanidade per se e, no entanto, nenhum alquimista (a variante mais antiga de psicólogo que existe) deixou de usar a Astrologia para seus fins semióticos. Aqui entra o uso da Astrologia, como se deve vê-la e usá-la.

A Astrologia, pela precisão e mecanicismo de suas analogias, é na realidade uma LINGUAGEM. Assim como a álgebra foi desenvolvida como uma linguagem humana para expressar idéias quantitativas (tentem descrever qualquer equação complexa ou matriz só com palavras!), a Astrologia em si é uma linguagem perfeitamente desenhada para expressar idéias relativas à psique e suas esferas de Luz e Sombra.

Na verdade, a força explicativa da Astrologia como um sistema lingüístico e simbólico para a Psique provém de alguns fatores:

1) Através do pano de fundo dos Astros, a Astrologia conseguiu condensar as principais forças primárias que, combinadas de infinitas maneiras, criam os diferentes padrões de julgamento, aprendizagem e sentimento. Fazendo uma analogia com a fórmula alquímica solve et coagula (dissolver e coagular), toda a parafernália da atividade mental humana foi decomposta e as forças principais foram identificadas; arrisco aqui chamar estas forças de Arquétipos.

2) Passo seguinte (simultâneo, na realidade), a Astrologia que no início da humanidade buscava entender acontecimentos externos à mente conseguiu estabelecer paralelos FUNCIONAIS, identificando Arquétipos subjacentes tanto ao funcionamento de uma Esfera astral quanto ao de uma determinada esfera psíquica, gerando um sistema não só de descrição, mas de explicação dinâmica do funcionamento da mente.

Nisto reside a grande força do pensamento astrológico, uma vez que ele seja devidamente entendido: não como um sistema que descreve relações causais entre os astros e a nossa vida, mas como um sistema que descobriu e passou a operar em cima das semelhanças arquetípicas entre as esferas celestes (como compreendidas pelos Aristotélicos) e os processos básicos que, assentados em premissas irredutíveis da esfera de sombra, organizam e constroem e interligam nossas redes de idéias e pensamentos.

Assim, por exemplo, o Sol, que é a fonte de energia dos processos biológicos, meteorológicos e gravitacionais do sistema solar, é arquetipicamente semelhante àquele núcleo da consciência que denominamos Ego, em torno do qual todas as conexões de sentido se criam e orbitam, de onde retiram energia e seu sentido referencial particular. Mercúrio, sempre próximo do Sol, representa os processos cognitivos, que é o primeiro desenvolvimento da mente após a definição de um ego, e após este, a base estrutural de todas as conexões de sentido. E por aí segue...

Se eu digo, por exemplo, que tenho Mercúrio em quadratura com Marte, a Razão e a Vontade se obstruindo mutuamente, estou descrevendo sinteticamente um indivíduo tenso, nervoso, que tende à neurose e ao pessimismo, possui dores de cabeça freqüentes, pensa em excesso antes de agir e, em geral, não consegue se decidir por um curso de ação, gastando energia mental esgotando todas as alternativas. Poupamos a descrição psicológica do tipo sintetizando estas características em seus termos Astrológicos. Assim como denotamos a razão de x está para y assim como 2 está para 3 com a notação 2/3.

E isso funciona?

Sim.

O mapa natal de uma pessoa, por exemplo, diz respeito à forma como suas conexões de sentido psicológicas são construídas, à forma de pensar... é perfeitamente válido questionar o porquê disto funcionar. E na verdade, a resposta não é simples: usando uma analogia, assim como os genes estão contidos no sêmen, e toda a informação necessária para o desenvolvimento de um fungo, em seus esporos minúsculos, o mapa astrológico que de fato ‘delineia’ a psique de um indivíduo é seu mapa natal, pois é o momento em que o indivíduo vem ao mundo como um ente particular é que ele inicia o processo de desenvolvimento de si mesmo, começa a desenrolar o pano de seus processos entelequiais, e é neste marco zero que se define a forma como o Ego veio ao mundo, e de que maneiras este Ego ligará, em torno de si, toda a cadeia de entes e conceitos e julgamentos e sentimentos e deduções.

E é por isso que, até hoje, se dá uma importância exacerbada à questão ‘qual é o seu signo’ – nosso signo é habitualmente o signo solar, a posição do Sol no Zodíaco, o que um Astrólogo experiente saber ser uma informação apenas entre várias que se podem extrair de um mapa astral. Mas tudo isso é assunto para o próximo artigo.

Próximos passos

Depois de tanta provocação, e de uma introdução (assumo) complexa – me desculpe, pessoal, para ficar bem explicado não pude escrever menos do que isso - tentarei delinear os principais astros nos próximos artigos, e somente depois disto, os signos zodiacais – junto com todos os comos e porquês do sistema zodiacal, e das 12 casas.

Então, quando tiver delineados os pontos básicos da Astrologia, que precisam ser conhecidos por qualquer um que leia, me dedicarei ao propósito original desse Blog – as minhas pesquisas sobre os astros, e as forças trans-saturninas, que são o grande divisor de águas entre a Astrologia tradicional e a moderna: farei um ataque à astrologia moderna para depois me posicionar definitivamente em sua defesa!

Espero que tenham gostado deste primeiro artigo, prometo que os seguintes serão mais simples e interessantes, e aguardo comentários!

QUE JÚPITER SORRIA A TODOS!

Bruno Laget




Ennoia, Isaria,
Aus der Lichte der Mond
Aus der Dunkel der Nacht
Nahst du dich in deiner Macht